Integral no sentido de Riemann - revisão


Tarcisio Praciano-Pereira

Introdução e motivação

Um telefone celular é um instrumento bastante complexo e que tem a capacidade de digitalizar sua voz, transferir eletromagneticamente pacotes desta digitalização e fazer a operação inversa, quando você recebe uma comunicação. Não vamos entrar nos detalhes até mesmo porque não dominamos todos os passos desta operação, o que vamos fazer aqui é mostrar-lhe parte deste processo, a parte matemática do processo.
E como o meu objetivo para entrar nesta área logo agora é o de motivá-la para estudar Cálculo, deixe-me observar que um aprofundamento neste tópico pode lhe servir de TCC, um programa de mestrado, e representa uma área promissora de trabalho como técnico da ANATEL, por exemplo. Se você conseguir conjugar a parte matemática com a parte computacional você estará dominando uma área de conhecimentos estratégica...

A definição geométrica de integral

A integral de uma função univariada pode ser definida como a área algébrica limitada pelo gráfico da função, o eixo OX e dois limites definindo um intervalo [a,b]. O símbolo

O símbolo da integral
representa esta idea e neste caso o intervalo é [a,b]. Veremos que esta definição é muito limitada e que ela pode ser generalizada o que faremos paulatinamente. Porém esta ideia serve como ponto inicial. Dada uma função nem sempre ela é integrável, também iremos aos poucos cobrir as possibilidades que existem quanto a esta limitação, entretanto vamos começar com as funções contínuas definidas em [a,b] quando sempre existe a integral.
Se considerarmos um dos limites variável,
limite variável na integral
esta expressão, comummente chamada, impropriamente, de integral indefinida, define uma nova função que chamaremos de primitiva da função f e iremos tentar manter a simbologia: f,F em que f é a derivada de F e, reciprocamente, F é uma primitiva de f associada à condição inicial a.
Neste momento estamos usando apenas dois nomes, primitiva, derivada mas logo vamos mostrar que tem sentido usá-los no sentido que o Cálculo lhes dá.

O cálculo da integral

Existem diversas fórmulas que foram descobertas ao longo dos quase trezentos anos de existência do Cálculo para calcular exatamente uma grande quantidade de integrais. Sabemos calcular, exatamente, qualquer integral de função polinomial, de diversas funções trigonométricas, de muitas funções que sejam composição de polinômios com funções trigonométricas, de algumas funções racionais ... Mas facilmente podemos cair numa integral para a qual não haja fórmulas que permitam o cálculo exato, e um exemplo bem simples é
Integral de 1/x
que é uma integral de grande importância prática porque 1/t mede a intensidade de diversos fenômenos de radiação, representando a quantidade de radiação relativamente ao tempo t. Voltaremos mais a frente a esta integral. Partindo da suposição de que existe a integral e que ela tem a definição geométrica que apresentamos, uma forma de cálcular a integral consiste em fazer uma aproximação do seu valor pela área de retângulos contidos na região limitada pelo gráfico de f , o eixo OX e os limites de integração definidos pelo intervalo considerado. O gráfico na figura
Somas de Riemann mostra geometricamente esta ideia. Neste gráfico tivemos o cuidado de fazer as subdivisões para minimizar os erros, um dos retângulos representa a área por excesso n'outro tanto há excesso como falta e nos demais a área foi calcula por falta, de modo que há uma certa compensação visual.
Porém muito melhor do que estas tentativas consiste simplesmente em reduzir a medida das bases dos retângulos e melhor ainda considerá-las todas iguais com valor delta-x = (b-a)/N em que N é a quantidade de tais retângulos, para finalmente fazer o cálculo com um programa de computador. Este refinamento você pode ver na figura abaixo em que subdividimos a base de cada um dos retângulos primitivos ao meio, mas com um programa de computador basta-nos fornecer o valor de N e verificar se a precisão desejada foi obtida. Isto é possível fazer se primeiro pudermos provar que a integral existe, e existe um grande estoque de funções integráveis, na verdade a maioria das funções que aparecem nos modelos matemáticos usados nas diversas ciências, e é isto que torna útil a integração aproximada.
Então, se a integral existir , é mais prático considerarmos as divisões que aparecem na figura acima calculadas uniformemente, com um passo que é igual delta-x (b-a)/n obtido pela divisão da medida do intervalo pelo número de retângulos com a mesma base delta-x $.

Um programa para calcular aproximadamente a integral

Com um simples programa podemos obter o valor aproximado da integral: Este programa se encontra, possivelmente com ligeira modificação, no link "programas" da página principal da disciplina, como todos os programas que escrevo, ele é publicado sob GPL o que significa que seu uso é livre inclusive para modificá-lo e distribuir, desde que seja mantida a indicação de que sou autor do programa.

Comentando o programa:

  1. A função principal (alguém poderia dizer que isto é falso, e com razão) é riemann() .
  2. Ela recebe uma variável do tipo ``função'' que deve estar definida na mesma folha de trabalho em que está definida riemann() , e mais a sucessão de parâmetros inicio, fim, n, respectivamente, o inicio do intervalo, o fim do intervalo, e o número de divisões, uniforme, N do intervalo de integração.
  3. tem as variáveis locais x, soma, deltax inicializadas com os valores inicio, zero, e (b-a)/N , respectivamente, em que a é o limite inicial do intervalo e b é o limite final do intervalo de integração.
  4. tem um laço que deverá correr enquanto x for menor do que fim. A variável x assume os valores iniciais de cada sub-intervalo, começa recebendo a e termina recebendo b - delta x que é o ponto inicial do intervalo que corresponde ao último retângulo.
  5. Ao findar o laço, riemann() devolve o produto soma*delta-x em que usamos a propriedade distributiva da multiplicação relativamente à soma. Neste caso usamos aquilo que é habitual ser chamado de ``colocar em evidência'', colocamos delta-x em evidência.
A rotina riemann() implementa o cálculo da soma das áreas dos retângulos como sugerimos que podia ser uma aproximação para a integral. Quer dizer que uma das afirmações acima é falsa: a segunda, devido a ``igualdade'', ou ainda, a ``soma'' é uma aproximação para o valor da integral. A expressão à direita nesta equações é um símbolo que representa a integral. À esquerda temos uma soma, chamada ``soma de Riemann'' contém um erro relativamente ao valor exato da integral. Este erro pode ser minimizado reduzindo o valor de delta-x $. Você pode testar este programa com casos conhecidos, por exemplo Acrescentando a linha:
print riemann(g,0,1,1000)
no arquivo riemann.py e executando num terminal, no mesmo diretório em que este programa estiver,
e como você pode ver que obtivemos uma aproximação do valor da integral:
O erro cometido é inferior 0.001 usando N=1000 divisões do intervalo [0,1] .
Existe um mito muito comum de que podemos conseguir precisões arbitrárias com cálculos computacionais e eu rodei o programa acima usando N = 1000000000 e abaixo você tem o relatório deste processamento: com praticamente 7 segundos de processamento obtive o valor da integral com um erro menor do que $0.000001$ mas exigir mais precisão da máquina pode tornar o resultado pior devido aos limites de arredondamento do algoritmo da linguagem e da capacidade numérica do processador. Mas o que interessa é que obtivemos aproximadamente 1/3 que é o valor exato desta integral, em pouquíssimo tempo de processamento.
Porém o cálculo
print riemann(g,0,1,1000000000000);
eu tive que interrompê-lo depois de 5 horas ... com uma máquina mais potente é possível analisar este resultado.
Você pode repetir esta experiência com outras funções, use qualquer função polinômial porque você conhece o resultado. Se não lembrar, refresque sua memória com o texto de Cálculo I e depois rode o programa acima, com funções polinomiais para verificar a aproximação obtida.

A função logaritmo

Interessante mesmo é o caso da função f(x) = 1/x que não está definida na origem, mas se o o intervalo tiver extremos com sinais iguais, ambos estritamente positivos ou ambos estritamente negativos, a função será contínua e terá integral. Esta função tem uma propriedade interessante que é fácil de demonstrar: quer dizer que podemos cancelar um dos limites de integração no caso particular da função f(t) = 1/t . Esta propriedade vale para qualquer função que seja múltipla desta função, e somente para elas. É uma propriedade privada desta classe de funções. Como consequência desta propriedade podemos facilmente calcular a integral

para qualquer potência do número positivo a. Observe o exemplo

em que usamos duas propriedades:
  1. A propriedade geométrica das áreas que nos permite subdividir uma região em um determinado número de regiões contíguas sendo a área total a soma das áreas dos pedaços;
  2. a propriedade fundamental da integral de 1/t .
Com algum trabalho podemos mostrar que

Implicitamente estamos fazendo uma definição:

A notação usual para o ``logaritmo natural" é ``ln'', entretanto em geral as linguagens de programação usam o símbolo ``log" para o logaritmo natural. Também podemos provar:

A demonstração usa, novamente, as duas propriedade listadas acima, da soma de áreas de regiões contíguas e a propriedade fundamental da integral de f(x) = 1/x. Tente fazer, você mesmo, a demonstração.
E como, usando a convenção inicial,

podemos dizer que F(x) = log(x) é a primitiva de f(x) = 1/x com a condição inicial 1. O nome é apropriado porque temos aqui uma função goza das propriedades do logaritmo sendo portanto um tipo de logaritmo porque você pode repetir tudo que fizemos acima com a função

e podemos finalmente associar K a uma das conhecidas bases de logaritmo. K=1 é apenas um tipo de logaritmo de forma muito natural chamado de logaritmo natural ... em particular K = 1/log(10) produz o chamado logaritmo decimal .
Os resultados que você obtiver com o programa acima, para o logaritmo natural, podem ser comparados com os valores que a linguagem de programação tem incorporado para a função log no algoritmo da linguagem.
Na lista de exercícios 02 há alguns exemplos em que você pode aplicar o programa, mas um uso inteligente do programa consiste em usá-lo para verificar os cálculos formais que você fizer, portanto, Não fazendo assim, você estará transformando o uso do programa, que é um auxílio didático que lhe oferecemos, num burro vídeo-game que em nada vai acrescentar aos seus conhecimentos.

A arte de calcular integrais

É uma arte difícil e povoada de incertezas representando com frequência um desafio considerável. Na verdade é o exemplo mais simples de uma área ativa de pesquisa em Matemática denominada equações diferenciais: encontrar uma primitiva de uma função significa resolver uma equação diferencial das mais simples
... Se não conseguirmos identificar o par de funções (f, F)

simplesmente não sabemos calcular a integral

usando o Teorema Fundamental do Cálculo que está expresso na equação acima. Há várias regras finas que precisamos conhecer e que se encontram incorporadas na memória dos diversos programas de Computação Algébrica, como maxima, axiom, entre outros.

Mudança de variável e regra da cadéia

Uma destas regras é consequência da regra da cadéia para o cálculo da derivada: f(g(x)) '= f ' (g(x)) g '(x) que no cálculo de integrais é usada sob o nome de ``mudança de variáveis'':

Derivada do produto e integração por partes

A regra do produto da derivação induz um método de integração chamado de integração por partes. Começando pela regra do produto para derivadas, temos

e aqui entra a ``arte na integração'', se pudermos identificar alguma integral como uma das integrais no segundo membro, poderemos reescrever a equação anterior como

e finalmente, se soubermos calcular

então podemos finalizar o cálculo da integral

Exemplos frequentes de uso deste método aparecem em integrais envolvendo produtos de polinômios e de funções trigonométricas, porque, sucessivas aplicações deste método terminam ``eliminando a parte polinomial'' com repetição de derivações fazendo que a última integral tenha apenas uma função trigonométrica que, se soubermos calcular sua primitiva, podemos usar a sequência para finalizar a primeira integral. Estas integrais de produtos de polinômios por funções trigonométricas são importantes nos chamados ``polinômios trigonométricos'' que aparecem dentro do assunto ``séries de Fourier'' e estas são parte significativa de diversas aplicações, entre elas a ``compressão de dados'', ``decodificação de informação'', antigamente a telefonia, que hoje usa uma versão atualizada dos polinômios trigonométricos , as wavelets , que novamente entram nas aplicações acima.
A segunda parte da lista 02 está voltada para estas aplicações.

Conclusão

Vale a pena relembrar as fórmulas de integração do Cálculo, e sobretudo deixar claro na memória onde elas se encontram para uma necessidade que você tiver de uso das mesmas. Outra conclusão é se você puder provar que a integral existe, um programa de computador simples como o que está neste texto pode lhe dar um valor bem aproximado para o valor da integral.

Algumas aplicações

Como a integral, se existir, pode ser aproximada arbitrariamente por soma de Riemann, podemos admitir que a integral generaliza as somas. No fundo isto é falso, esta foi apenas um ponto de partida para chegar ao conceito de integral, mas é possível conviver com esta ideia algum tempo. Faremos isto!
Pensando desta forma, podemos chegar a uma expressão para o produto escalar usando integral. Antes de escrever a definição deixe-me fazer algumas considerações para colocar os conceitos num contexto adequado.
Primeiro, que o produto escalar é uma operação entre vetores. Então vamos ver as funções como vetores, e vamos deixar-lhe o cuidado de verificar que todas as propriedade dos ``vetores'' se aplicam aos objetos do tipo função.
Segundo, ao definirmos o produto escalar no fixamos em um certo espaço, e esta é uma atitude natural quando definimos operações - elas são válidas dentro de um determinado espaço.
Dito isto, os espaços de funções que vão nos interessar é das funções contínuas definidas num intervalo da reta. Insistimos que você também verifique que este "conjunto" das funções reais contínuas definidas no intervalo tem as mesmas propriedades que o R2, por exemplo.

Se você avançar mais em seus estudos de Matemática verá algumas surpresas interessantes neste contexto que ficarão omissas neste texto uma vez que eu não teria condições de justificá-las.
Mas, resumidamente, esta definição nos permite a falar de conceitos geométricos com os vetores do tipo função, por exemplo podemos falar do ângulo entre duas funções, ou quando duas funções são ortogonais e aqui você vai ver uma surpresa agradável - isto acontece quando as funções contém informações de conjuntos disjuntos, uma delas sendo nula no outro conjunto, e vice versa.
Mas nem sempre é tão simples o significado de ortogonalidade, por exemplo, vamos afirmar que sin, cos são ortogonais, que sinj e sink com j diferente de k, são ortogonais. As definições destas funções aparecem mais abaixo.
De imediato queremos introduzir uma aplicação que a lista 02 traz.

O espaço das ondas eletromagnéticas

Você já deve ter usado um telefone celular, certamente. Então é uma usuária de ondas eletromagnéticas e o seu aparelho usa um espectro bem definido de ondas eletromagnética para que você possa ser encontrada.
Um telefone celular é um instrumento bastante complexo e que tem a capacidade de digitalizar sua voz, transferir eletromagneticamente pacotes desta digitalização e fazer a operação inversa, quando você recebe uma comunicação. Não vamos entrar nos detalhes até mesmo porque não dominamos todos os passos desta operação, o que vamos fazer aqui é mostrar-lhe parte deste processo, a parte matemática do processo.
E como o meu objetivo para entrar nesta área logo agora é o de motivá-la para estudar Cálculo, deixe-me observar que um aprofundamento neste tópico pode lhe servir de TCC, um programa de mestrado, e representa uma área promissora de trabalho como técnico da ANATEL, por exemplo. Se você conseguir conjugar a parte matemática com a parte computacional você estará dominando uma área de conhecimentos estratégica...
O programa fourier.gnuplot contém toda a experiência que está esboçada nas duas últimas questões da lista. Como sin, cos são ondas básicas, em outras palavras, com elas podemos compor qualquer outra onda, então a expressão

tem um significado geométrico entre estes dois vetores.
Com uma pequena modificação no produto escalar definido acima, podemos provar que sin, cos são vetores unitários:

Este resultado vale para qualquer seja a onda básica com a frequência acelerada: sin(nx), cos(mx). Temos, assim, uma família não finita de vetores unitários, perpendiculares entre si:

Você tem aqui tudo de que fala a Álgebra Linear, apenas o espaço é de dimensão infinita, e é isto que permite que as privadas de telecomunicação} sonharem com um mercado infinito de telefones celulares, e até poderiam nos impingir bem mais se o fizessem acompanhando com os equipamento de transmissão que desonestamente elas não querem comprar e fazer os investimentos que a ANATEL estaria obrigada a fiscalizar o que também ela não faz.

As duas últimas questões da lista 02 mostram as projeções de duas ondas calculadas nas direções dos vetores unitários sinj, cosj. Elas também mostram que a metodologia da arte de cálcular integrais é insuficiente para nos habilitar neste cálculo como mostra uma ``onda'' definida algébricamente como o são $W, \Omega$ na lista. Sem métodos computacionais nossas telecomunicações teriam que se arrastar como tartarugas. Obviamente, elas andam como preguiças devido à irresponsabilidade das privadas de telecomunicações que não fazem os investimentos a que estão obrigadas, devido à ANATEL que não exerce com seriedade a sua função de fiscal.